21 outubro 2012

Silêncio.


                                                                                                                       Foto: Mariana Andrade.

O silêncio guarda segredos que as palavras nunca conseguirão desvendar. O silêncio cita devaneios antigos, traz à tona sentidos esquecidos, sem nenhum significado. O silêncio brinca com sonhos, com olhares, com sentimentos. O silêncio fala. Consegue traduzir a vida intensamente, deixando os ruídos com ciúmes por não conseguirem carregar tamanha dualidade: Um vazio cercado de entendimento.
E assim o tempo se apagou. O tempo se apagou e trouxe consigo o silêncio, a quietude, o encontro com aquele vazio esquecido em outrora. O tempo se apagou e levou consigo as velhas palavras. Era como olhar sem sentir, era como um corpo sem alma que queria gritar, mas não produzia som. Foi assim que a menina gritou o silêncio e o vácuo preencheu sua existência, enchendo-a de uma coragem medrosa.
A menina passou a gostar dessa fuga de palavras. Fugiu para um lugar distante, cheio de pequenas gaivotas e gaitas que cantavam sozinhas. Ela não queria mais encontrar sentido nas velhas vidas passadas, ela queria somente resgatar as vogais que haviam fugido dos seus pensamentos. A menina passou a não sentir a lógica, ela não obedecia aos mesmos padrões, ela dançava no escuro, pintava seu quarto de amarelo. A menina não queria sorrir por fora e, como uma bomba, soltava gargalhadas presas dentro do seu vazio. Será que ele aumentaria?
Deitada na cama, a menina podia ouvir as palavras correndo e atravessando o vão da porta. Disseram que alguém poderia roubá-las. Quem poderia roubar as palavras de alguém? Mas a menina deixava, ela deixava qualquer coisa. Ela deixava a porta aberta, o chão aberto, o teto sem estrelas. A menina deixava passar qualquer resquício de falta, ela não precisaria mais sentir saudades, haviam roubado isso, também. Sorrisos? Será que roubariam?
A menina simplesmente deixava o tempo escorrer entre seus dedos. Já era dia, já era noite. Um entardecer trazia sua beleza e no amanhecer ela respirava a brisa de um recomeço. A menina gostava de jogar as palavras na parede. Gritava os restos do que havia sobrado e deixava lá, escorrendo por entre as frestas sujas de sentimentos cuspidos. A menina queria sentir uma nova vida, um novo nascer, diferente do seu. Agora ela precisaria renascer por entre espinhos e buracos escondidos, cavados e encobertos por ela mesma. Era um destino mal traçado, perdido em meio de sonhos acordados. Estranho, não? Ela não entendia tantos pensamentos partidos.
E foi assim. Foi silêncio. Ela só precisaria de um pequeno novo tempo, perdida em si mesma. Ela partiria em uma viagem de vida, agora só, como ela sempre quis. Agora ela iria buscar suas palavras, amarrá-las em seu coração e carregá-las como uma criança que precisa de cuidados. Ela precisava de ideias, de tempo, de espaço. Era estranho ter aquele vazio tão pequeno, ela sabia. Agora tudo estava bem. Ela só acumulava coragem. A pequena nuvem ainda estava confortável. Era preciso sonhar.


08 outubro 2012

E assim, espero.


                                                                                                                   Foto: Mariana Andrade.

Eram as mesmas gotas de chuva que caíam naquelas velhas telhas de barro. Vento frio, sem aconchego. Ainda vestia aquele blusão velho que pertencia a você. Ficava vendo de longe o tempo passar, como em outrora. Lembrava-me do abraço que havia sido entregue naquele beijo que partiu. Lembrava-me daqueles corpos unidos em um único desejo de substituir seu próprio vazio, contando horas passadas e brincando com o relógio antigo que havia sido esquecido no mesmo lugar. O tempo divagava em seu próprio tempo, rasgando a saudade com seus ponteiros velhos, sem nenhum significado. Eram dias que passavam e, sozinha, sempre me lembrava das últimas palavras que foram levadas pelos faróis acesos daquela noite que nunca se apagou.
Vento vinha. Vinha tanto vento que meus cabelos brincavam, divertiam-se e tentavam fugir de tamanha tristeza. Era um coração que palpitava a cada ranger de porta, a cada passo de um desconhecido que sempre se parecia com você. Era um tempo antigo que ainda se recheava com os mesmos planos, com os mesmos desejos sem um adeus. Era uma alma apagada por uma borracha invisível, fria, com consistência de dor. Era uma borracha feita de você, que só soube dizer adeus, sem amor, sem nada.
Já te disse como o céu fica laranja quando chora? Já te disse como o vento esfria e a velha cama de madeira engrandece? Ao dizer que não me amava mais eu entendo que você nunca me amou.
Agora é tarde. O velho futuro de nós dois já está apertado em meu peito, como um nó que não se solta. Agora tudo se transformou em saudade e eu não entendo como você conseguiu ser tão cruel a ponto de partir sem nem me ajudar a enxugar essas gotas que insistem em molhar as telhas dessa mesma casa vazia. Agora é fim, é ponto, é adeus, desilusão, é você. E é o mesmo blusão, o mesmo você que, depois de partir e despedaçar minha vida em pequenos pedaços, ainda é quem me engrandece e me faz acreditar que os mesmos faróis ainda entrarão na antiga garagem e deitarão na cama vazia que ainda guarda amor de nós dois.




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